Diagnóstico de covid-19 pela saliva é desenvolvido por pesquisadores da USP
Pesquisadores do CEGH-CEL (Centro de Estudos do Genoma Humano e de Células-Tronco) estão desenvolvendo 1 teste de diagnóstico do novo coronavírus pela saliva. É a 2ª testagem do tipo em desenvolvimento no Estado.
Em fase final de desenvolvimento, o novo exame será alternativo e poderá custar 1/4 quarto do valor do teste de RT-PCR, considerado o padrão-ouro para o diagnóstico da COVID-19 e realizado hoje por laboratórios no Brasil a 1 custo que varia entre R$ 350 e R$ 400.
Vinculado ao Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (IB-USP), o CEGH-CEL é 1 dos CEPIDs (Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão) financiados pela Fapesp.
“Assim como o exame pelo método RT-PCR, o novo teste será usado para detectar o vírus durante a infecção”, diz Maria Rita Passos-Bueno, pesquisadora do CEGH-CEL e coordenadora do projeto.
O teste será similar aos já desenvolvidos no Brasil e em outros países com o objetivo de aumentar a disponibilidade e a rapidez e diminuir os custos para realização de testes moleculares por meio de simplificações dos processos.
Nos Estados Unidos, por exemplo, a FDA (Food and Drug Administration) – agência regulamentadora norte-americana de alimentos e fármacos – já concedeu autorização de uso de emergência para 5 testes de diagnóstico de covid-19 baseados em saliva. A última foi para o chamado SalivaDirect, desenvolvido por pesquisadores da universidade Yale.
No Brasil, o laboratório de genômica Mendelics criou e já comercializa 1 teste similar, e pesquisadores da Universidade Federal de Goiás estão desenvolvendo 1 kit de diagnóstico na mesma linha.
MÉTODO MAIS SIMPLES
Os novos testes são baseados em uma técnica molecular amplamente utilizada para o diagnóstico de doenças infecciosas, como dengue, chikungunya, hepatite A e zika, chamada RT-LAMP (sigla em inglês de transcrição reversa seguida por amplificação isotérmica mediada por alça).
A técnica molecular tem algumas semelhanças com o método RT-PCR, que utiliza como amostras para realização dos testes secreções do fundo da garganta e do nariz. Em ambas as técnicas são induzidas reações para a realização de uma fase de transcrição reversa (RT), na qual o RNA do vírus é transformado em DNA, e uma fase de amplificação, em que regiões específicas do vírus são replicadas milhões de vezes para que o patógeno possa ser identificado.
Porém, o RT-LAMP não requer a extração do RNA do vírus para ser detectado, o que é feito no RT-PCR por meio de reagentes importados, que são caros e frequentemente escassos no mercado, dependendo da demanda. Além disso, o RT-LAMP dispensa o uso de aparelhos laboratoriais complexos, como o termociclador em tempo real, utilizado para amplificar e detectar o RNA por meio da exposição do material a diferentes temperaturas.
“Além de a amplificação do material viral ser feita em uma única etapa, sem a necessidade de extração do RNA, o RT-LAMP também permite que esse processo ocorra sob temperatura fixa de 65 oC, por exemplo, por meio de equipamentos simples, como 1 recipiente em banho-maria. Isso também contribui para simplificar o processo e diminuir o tempo para sair o resultado”, afirma Passos-Bueno.
Pelo RT-LAMP, a eliminação da etapa de extração do RNA – a mais demorada e complexa – permite não só reduzir o tempo, mas também o custo do teste, explica a pesquisadora. “A etapa de extração do RNA no teste de RT-PCR pode levar de 1h a 5h, dependendo do sistema utilizado. A eliminação dessa etapa permite uma redução de 30% no valor final do teste de RT-LAMP”, diz.
A eliminação da etapa de extração do RNA pelo teste de RT-LAMP é possível pelo rompimento do capsídeo do vírus por aquecimento e adição de uma solução desenvolvida pelo grupo, que estabiliza o vírus para os processos de conversão do RNA viral em DNA e para a amplificação do material genético do vírus para facilitar a detecção dele em saliva.
Todo esse processo ocorre em temperatura constante, em 1 método chamado amplificação isotérmica mediada por loop (LAMP, na sigla em inglês).
As enzimas necessárias para a realização desse processo são importadas e representam o maior custo para a aplicação do teste. Um grupo de pesquisadores do Instituto de Química da USP, liderado pelo professor Shaker Chuck Farah, contudo, desenvolveu essas enzimas em laboratório.
“Conseguimos ter a produção nacional dessas enzimas, que são os principais insumos do teste. Isso possibilitará diminuir ainda mais os custos”, afirma Passos-Bueno.
PADRONIZAÇÃO DO TESTE
Os pesquisadores pretendem, agora, avançar na etapa de padronização do teste, por meio da utilização de soluções químicas que permitam manter o RNA do vírus estável por 1 longo tempo, de modo que não sofra a ação de enzimas presentes na saliva.
“A saliva possui uma série de substâncias que podem inibir a ação das enzimas, degradar o próprio material do vírus e interferir na reação de amplificação. Por isso, estamos desenvolvendo tampões que permitam padronizar as condições de manutenção da saliva e do RNA do vírus para realizar o teste de forma a diminuir o risco de resultados falso-negativos”, explica Passos-Bueno.
O teste tem apresentado especificidade para detecção do novo coronavírus de 100%, equivalente ao de testes convencionais. Os pesquisadores pretendem, agora, aumentar ainda mais a sensibilidade de modo que seja capaz de detectar o vírus em 4 número muito baixo de cópias na saliva.
“O teste já está com boa sensibilidade, com a capacidade de detectar até 10 cópias de vírus por reação em amostras de saliva”, afirma a pesquisadora.
O sistema prevê a autocoleta pelo paciente e permitirá, de forma indolor e não invasiva, o recolhimento da saliva em 1 tubo de ensaio. Com isso, diminui-se o risco de contágio já que não será mais necessária a atuação de um profissional de saúde paramentado e treinado para a retirada de amostras de nasofaringe, como ocorre no exame de RT-PCR. Além disso, o uso da saliva dispensa o uso de swabs – cotonetes longos – para a testagem.
A previsão é que o resultado fique disponível entre 30 e 40 minutos. “O resultado pode ser enxergado praticamente a olho nu, porque o tubo contendo a amostra de saliva muda de cor de acordo com a presença ou não do vírus. O resultado negativo aparece na cor rosa e o positivo em amarelo”, diz Passos-Bueno.
Um dos objetivos do projeto é oferecer o teste em localidades com pouca infraestrutura para coleta e análise, por meio da inclusão dos laboratórios de referência das universidades para ampliar a capacidade de testagem no país.
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